Se, em 1987 (ano de fundação das faculdades de moda no Brasil), perguntássemos a uma estudante que se sentava pela primeira vez num banco universitário de um curso superior de moda o que ela queria para seu futuro, com certeza ela diria algo como ter sua própria marca de luxo ou desfilar em Paris. Hoje, neste estranho ano de 2021, a cara do futuro é outra: a chamada Geração Z quer, em primeiro lugar, uma indústria de moda sustentável.
Fernanda Lopes, paulistana, é uma representante dessa geração transformadora que com apenas 24 anos já é graduada em Design de Moda pela Universidade Anhembi Morumbi. Apesar de já ter concluído um curso superior na área de moda e até mesmo de ter sido introduzida a diversas informações relativas à sustentabilidade durante as disciplinas da graduação, ela sente que o que aprendeu até agora é insuficiente e se matriculou no curso Moda pela Mudança da Fashion For Future.
Por que jovens como Fernanda - principalmente mulheres -, estão buscando cada vez mais informação e formação qualificada sobre sustentabilidade? Fernanda nos conta que trabalhando em uma marca que tem como propósito a sustentabilidade, “é necessário pesquisar e estudar sobre o assunto para não repetir um padrão de uma indústria que não é viável nem para quem produz, nem para quem consome ou nem para a qualidade do ambiente no qual vivemos.” Segundo a jovem designer, “precisamos ir atrás de cursos e conteúdos sérios pra resolver isso, pois o que tem por aí, além de pouco, é raso.”
Fernanda faz parte de uma geração de sorte, podemos dizer assim. Ela, já na faculdade, teve contato com conteúdos sobre sustentabilidade e também teve a oportunidade de discutir esse assunto com alguns professores-pesquisadores sobre o tema, colocando suas inquietudes e dúvidas. Isso é tanto verdade que, quando ela saiu em busca de estágio, foi Fernanda quem “selecionou empresas” que tivessem a sustentabilidade como um valor inegociável. No fim do estágio, quando foi a vez de procurar um contrato de trabalho de longo termo, os mesmos valores a guiaram. Ela começou trabalhando como vendedora na Oriba e, assim que surgiu uma oportunidade, assumiu uma vaga como Analista de produto.
Na Oriba, que é uma marca de moda masculina que pensa a produção consciente – qualidade, preço justo para quem compra e remuneração justa para quem faz –, Fernanda participa de todo o processo de desenvolvimento de produto. “Pesquiso muito sobre sustentabilidade, faço fichas-técnicas, analiso a concorrência, atuo também no desenvolvimento da peça piloto, tenho o contato com os fornecedores etc., enfim, participo do zero do produto até a sua finalização.” Nessa vivência, ela vem ampliando sua visão e consegue enxergar cada vez mais, por dentro, quais são os grandes desafios da moda sustentável.
“Acho que os desafios são muitos. O que é ensinado na faculdade ou mesmo o que temos como informação por aí, é muito diferente daquilo que é viável na indústria. Na prática é um pouco diferente: por exemplo, não conseguimos ter acesso a muitos materiais por falta de tecnologia e, como há pouca cobrança ou demanda por esses materiais por falta de conhecimento dos designers, ninguém quer investir. Se as marcas fossem mais a fundo, soubessem que é possível exigir mais, teríamos bem mais opções além do pet reciclado ... Haveria bons materiais não muito caros e bem mais disponíveis. Assim, cobrar mais tecnologia sustentável é um dos desafios em meu ponto de vista.”
Fornecedores, preparem-se, pois o designer do futuro é esse que sabe que mudar é possível e é exigente. Fernanda, por exemplo, matriculou-se no curso Moda pela Mudança “porque acreditei que agregaria ao meu conhecimento, pois já venho utilizando no meu trabalho ideias que ouvi nas lives da Fashion For Future com diferentes profissionais ou nas leituras dos materiais que vocês disponibilizam.” Ela vê que os resultados que ela poderá alcançar no curso são muitos e resultam da soma do perfil acadêmico, de design e técnico que esse curso trás. Fernanda afirma que essa junção de saberes e experiências representa bem mais a realidade que enfrentamos, pois, afinal, sustentabilidade tem a ver com o impacto de uma coisa na outra e é uma prova de que tudo está ligado. “Um curso que traz pessoas de diversas especialidades é o oposto de uma coisa rasa, pois reflete sobre porque a gente consome do jeito que consome, mas, também, coloca isso dentro da realidade da moda, começando com a matéria prima e chegando até o produto na loja.”
De fato, a geração da sociedade da informação nota quando a informação oferecida é rasa, principalmente em épocas onde todos surgem especialistas todos os dias, sobretudo em assuntos que “estão na moda,” como é o caso da sustentabilidade. Além disso, nos cursos de moda técnicos ou superiores, alguns currículos podem estar engessados em seus projetos pedagógicos e, mesmo contemplando a mudança, não conseguem trabalhar na velocidade e na interdisciplinaridade que é necessária para implementar tantas coisas novas. Quem nunca viu um "professor de sustentabilidade" falando sozinho, como se a sustentabilidade fosse uma miragem e não o futuro? Isso acontece porque mudar é difícil quando quase tudo que aprendemos e praticamos sobre moda até agora perseguia, como objetivo, a velocidade e o descartável.
A cara do futuro é bem diferente. Ela quer aprimorar o olhar, ler o mundo, entender a influência e a relação entre as coisas, como por exemplo, notar que a oferta de matérias-primas baratas e de baixa qualidade, produção acelerada e modelos de negócios baseados unicamente na novidade são responsáveis por termos chegado até aqui. Por isso, o investimento pessoal da Fernanda em sua formação, tem a ver com “o despertar da consciência das pessoas”. Ela quer, com “informações mais profundas,” capacitar-se “a criar e a desenvolver algo que quebre esse ciclo e construa uma moda mais saudável.”
Um dos entraves para uma moda mais sustentável no Brasil, para Fernanda, é a falta de informação que leve em conta o sistema da moda. Com a informação, na sua visão, será possível promover uma educação que vise a sustentabilidade e conscientizar mais as pessoas para que se esforcem em conjunto.
“A gente tem muito potencial, mas me frustra muito não ter governo, educação, tecnologia que visem a sustentabilidade. Em conjunto, isso dificulta o desenvolvimento de uma indústria sustentável.”
A palavra mudança está na essência dessa geração com capacidade intelectual e força de vontade para moldar o futuro. A informação, por enquanto, é a principal ferramenta para “modificar a vida das pessoas e fazer com que elas despertem para esse problema, questionando e melhorando seus hábitos,” afirma Fernanda. Na sua opinião, marcas com propósitos e com boa comunicação conseguirão fazer isso, ajudando, finalmente a impactar positivamente a vida das pessoas.
Quanto ao futuro?
“Um dia eu quero atuar diretamente na construção de ideias. Não há nada mais impactante do que ajudar uma pessoa a mudar. Um dia, alguém me impactou e eu quero fazer isso também. Mudança tem a ver com pessoas. Não adianta fazer produtos sustentáveis se as pessoas são viciadas no que não é sustentável, não é viável para a sociedade ou é prejudicial. O que eu puder fazer para influenciar as pessoas, na indústria ou na educação, vou fazer.”
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